Page 79 - JOÃO (Entrevistado por Douglas Machado)
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Seu João, estamos chegando ao final. Eu, particularmente, fico muito impressionado –
                                                          com a idade que o senhor tem – ainda manter esse vigor, que eu imagino ter sido do Seu
                                                          João, com os seus 18 anos, seus 25 anos, seus 40 anos. Um homem sempre presente nas
                                                          lojas, nas empresas, sempre presente na família e na vida dos amigos. No que é possível
                                                          se distanciar de si mesmo, como o senhor vê sua própria trajetória à luz dos dias de

                                                          hoje?
                                                          Ontem, esteve aqui uma jornalista pedindo para que eu fizesse uma entrevista com ela.
                                                          E uma das coisas que ela falou, e todo mundo fala no início de uma história, geralmente
                                                          a gente coloca a palavra “sonho”, entendeu? “O senhor sonhava com isso tudo?” ou

                                                          “Como era que o senhor sonhava?”. Eu acho que o sonho é uma ficção, é um desenho
                                                          invisível que a gente traduz ele na forma que a gente bem acha. E muita coisa a gente
                                                          culpa o sonho e o que vem de bom se diz: “Esse foi o meu sonho”. A gente vive sempre
                                                          sonhando. E eu disse para ela: “Na realidade, a gente sonha a vida toda. Esse sonho,
                                                          mesmo sem sonhar, que é o que a gente pensa que gostaria de ser. Pode ser um sonho,

                                                          mesmo sem ter sonhado. Eu não sonho muito, mas, às vezes, a gente sonha uma coisa
                                                          tão confusa que a gente não sabe dizer o que foi”. Na realidade, a gente idealiza o que
                                                          nós colocamos como sonhos. Quando criança, sonhamos com uma bola, para jogar,

                                                          não é? Está entendendo?... Uma chinela bonita, um par de sapatos, naquele tempo, não
                                                          é? Depois, mais tarde, a gente vai sonhando com uma bicicleta, com um brinquedo, um
                                                          brinquedo pode ser feito de qualquer forma, dependendo da sua situação, não é? Você
                                                          vai brincando, vai sonhando, fazendo seus brinquedos, entendeu?... Um carrinho, um
                                                          cavalo, se não tem o cavalo natural, faz um cavalo de pau. Hoje, a gente tem até esse

                                                          termo “cavalo de pau”, relacionado a carro, mas o cavalo de pau mesmo, o primitivo, era
                                                          de madeira. A gente fazia como se estivesse montado num animal. E aquele cavalo de
                                                          pau a gente fazia dele o que queria, fazia curva rápida, e lá se vai... porque era um cavalo!

                                                          Então, a gente vai sonhando no brinquedo, vai sonhando na bola, na bicicleta... Esse foi
                                                          um sonho muito grande meu! Realizei com 20 anos, comprando uma bicicleta usada.
                                                          Aí vem o namoro, conseguir namorar: “Meu sonho é aquela menina, não sei se o pai
                                                          dela quer”... Hoje, já não tem muito isso, não é? Aí depois realizei o sonho do namoro,
                                                          aí vai pensando em sonhar com o casamento, organizar a casa. Porque, naquela época

                                                          – não sei se hoje ainda é –, o rapaz casava quando tinha condição de preparar uma
                                                          casinha, e a moça trazia o seu enxoval. Até no enxoval vinha uma máquina de costura.







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